Simulacro
As pessoas podem até negar, mas a verdade é que a aparência e as roupas são muito consideradas na hora de avaliarmos aqueles a nossa volta. Sempre fui radicalmente contra essa atitude, valorizando o interior dos indivíduos que me circundam. Hoje tenho uma posição mais branda sobre o assunto, não que tenha passado a olhar apenas as vestimentas das pessoas, esquecendo seu caráter e intenções, contudo, o tempo me fez perceber que, às vezes, uma mudança de estilo momentânea se faz necessária. Apesar dessa nova forma de encarar o assunto, em determinados momentos a reação de algumas pessoas me surpreende. Hoje foi um dia desses. Sexta à noite, hora de descontrair, de estar vestido como gostamos e não como o trabalho exigi. Sigo para o shopping com três amigos, dentre eles, um casal de namorados, que por virem direto da labuta estavam vestidos socialmente. Em certo momento, nos separamos, meninas para um lado e meninos para o outro. Quando eu e minha amiga estávamos próximas ao Mc Donalds. Percebo um ser nos olhando abismado. No mínimo, estava pensando: “O que essa patricinha de blusinha rosa, sapato rosa e bolsa rosa (minha amiga) está fazendo com esse projeto de punk (eu, de tênis surrado, calça jeans totalmente larga, blusa preta e blusão quadriculado jogado por cima)?”... Passado alguns instantes, sem que a criatura tirasse os olhos de nós, o quarteto se refez com os meninos chegando ao Mc Donalds. O contentamento do ser era latente, afinal tudo estava explicado. A patricinha namorava o almofadinha de casaco no pescoço e o projeto de punk namorava o cabeludo (meu amigo, que estava em seu melhor estilo roqueiro, All Star, calça e jaqueta jeans). Esse mundo de aparências...
Que a memória do ser humano é seletiva eu já sabia, mas estou chegando a conclusão que a nossa mente, pelo menos a minha, só armazena os dados menos importantes. A maioria já deve ter visto o filme “O nome da rosa”, inspirado na novela de Umberto Eco. Se não teve a oportunidade de assistir, provavelmente leu o livro ou, no mínimo, ouviu falar. Pois bem, em meio a uma misteriosa morte de monges, ocorrida em um mosteiro do século XIII (acho que é essa a época, olha a memória seletiva atuando novamente), uma série de discussões interessantes e importantes são travadas, como, por exemplo, um debate entre os Franciscanos e os representantes do Papa acerca da pobreza de Cristo e do despojamento de riquezas por parte da Igreja Católica. A primeira vez que assisti a esse filme foi na oitava série, há nove anos, e hoje fui compelida a vê-lo outra vez, pois meu namorado precisava fazer um trabalho para a faculdade. Tenho que admitir que a minha memória, além de seletiva, é muito ruim para filmes, geralmente, dois dias depois de assisti-los, eu não consigo mais contar a história linearmente. Dentro desse quadro, esperava não lembrar de cena alguma da narrativa de Umberto Eco, afinal são nove anos. Mas, para a minha surpresa, eis que no meio do filme, me pronuncio: “Agora o Adso vai pegar a camponesa”. Como assim? Imersa em discussões filosóficas e históricas eu apenas lembro que o narrador da história come a personagem que originou o título da narrativa... Definitivamente, eu era muito pornográfica aos quatorze anos.
Sou totalmente contra aquelas frases machistas que tentam tirar a credibilidade da mulher em determinadas tarefas, como, por exemplo, a velha afirmativa de que não servimos para dirigir. No entanto, preciso dar meu braço a torcer, a teoria de que as mulheres não têm senso de localização é perfeita para mim. Se bobear, sou capaz de me perder dentro de um apartamento com apenas um quarto... Andar de metrô, então, é quase uma viagem a um país totalmente desconhecido. Sempre preciso perguntar a algum funcionário que sentido devo pegar, isso porque o metrô carioca só tem dois sentidos... Hoje, no auge da minha falta de senso, mesmo após ser informada que deveria ir para o sentido da zona norte, consegui descer para o lado errado... Felizmente, não embarquei no metrô e, quando percebi a burrada, procurei um guardinha que me indicou como fazer para chegar a outra plataforma. Quem tem boca vai a Roma, ou melhor, ao Shopping Nova América.