Ao Meu Redor

22 fevereiro 2006

Berlim cultural

Não sou muito a favor de colocarmos muros entre as gerações. Será realmente necessário que envelheçamos enclausurados nos costumes repassados a nós quando crianças? Será que não podemos absorver o novo, misturando-o aos velhos hábitos? É verdade que pertenço a uma geração de transição, o que talvez torne essa mistura mais simples para mim. Nasci em 1982, computadores em casa eram inimagináveis. Meu primeiro trabalho de faculdade, em pleno ano 2000, por incrível que pareça, ainda foi na velha máquina de escrever. À época, os computadores em casa já não eram tão inimagináveis, mas ainda eram um sonho para algumas famílias, feito a minha. Aliás, foi nesse mesmo ano que tive meu primeiro contato com a internet, nos vagarosos computadores da Uerj. E assim foi feita minha passagem de mundos. Mas, se eu sou o meio, vamos aos extremos.

Acredito que meu pai é um bom exemplo de extremo. Chegar próximo a um computador? Nem pensar. A menos que seja para pegar algo que esteja perto da bendita geringonça. Até pouco tempo, tínhamos em casa dois arcaicos exemplares de máquina de escrever. Inclusive, um deles, aquele em que “bati” o meu trabalho de faculdade, ainda está por aqui em algum lugar, só não sei exatamente onde. Para meu progenitor, comprar, pagar contas ou fazer uma simples declaração de isento pela internet é quase uma heresia... E todo ano lá vai papai para a casa lotérica com seu formulário de declaração, devidamente preenchido por mim, é claro!

Enquanto isso na outra ponta, temos os adolescentes, cerca de seis anos mais novos do que eu, que tiveram o primeiro encontro com os bytes lá pelos doze anos ou, até mesmo, mais cedo, dependendo do poder aquisitivo da família. São esses jovens que, para meu espanto, não reconheceram o desenho de uma máquina de escrever, feito por mim durante uma brincadeira. E a culpa nem pode ser colocada na minha inaptidão para desenhar, pois uma amiga, de uns quarenta anos, identificou o esboço, entregando sua idade.

É durante o confuso reconhecimento da existência dessas várias gerações, que faço uma descoberta mais assombrosa, vem aí uma quarta geração. Quem está acompanhado nos telejornais o cerco da polícia a uma rede mundial de pedófilos, não pôde deixar de ouvir a notícia sobre um rapaz, de dezessete anos, que faleceu ao cair pela janela de seu apartamento no Rio. O jovem teria tentado fugir ou mesmo se jogar (ainda não sabemos ao certo), enquanto os investigadores vasculhavam em qual computador da residência existia material relacionado à pedofilia. Isso mesmo: “em qual computador”, pois a casa guardava a máquina de seus pais e a do jovem. Foi então que constatei: os filhos dessa geração, que agora está com dezesseis, dezessete anos, e até mesmo os filhos dos meus amigos terão pais que disputarão o computador com eles... Pelo menos até inventarem uma nova geringonça mais avançada, que só fascine os jovens...